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sábado, 15 de outubro de 2011

AS VEZES EM QUE ME APAIXONEI POR FUTEBOL





Eu, como outros tantos incontáveis brasileiros, assisti ao jogo do Brasil contra a Holanda. Quando esse chegou ao fim, passei a ouvir de múltiplas bocas a palavra "tristeza". Então comecei a pensar no que o futebol e esse tal sentimento que já se dizia unânime significavam para mim.

Numa família cheia de amantes da bola, sempre fui vista como ignorante no assunto. Se resolvo parar diante da TV em hora de jogo e esboçar qualquer comentário espontâneo, logo me tornam motivo de riso geral e eu acabo rindo junto porque me vem a consciência de que, em termos técnicos, realmente nada tenho a acrescentar.

A primeira copa da qual me recordo é a de 94. Percebi isso durante o último jogo da seleção, pois aquilo de que me lembro mesmo, cá entre nós, são uns tais gêmeos holandeses e loiros, cujas testas salientes e as pernas bem desenhadas devem ter tocado com força a menina que então eu era, aos sete anos de idade.

Mas lembro também, ainda que essas imagens me cheguem de forma mais difusa, aquele jogador brasileiro de nome Leonardo. Não sei se pelas feições delicadas - uma harmonia de traços, um cabelo talvez mais comprido e mais cuidado que os demais, um nariz que me agradava... - ou se por ter sido expulso, após golpear com o cotovelo um jogador adversário, só sei que, enquanto a TV repetia aquele seu gesto violento e todos aqui em casa, sentindo-se cheios de razão, ralhavam com ele, eu o perdoava em silêncio e telepatia.

As outras copas que se sucederam, pouco guardei na memória. Delas, possuo apenas a impressão de, dado um acaso ou outro, ter me demorado a observar com particular simpatia alguns argentinos e italianos, pelas mesmas razões incertas que nos levam, abobalhados, a torcer o pescoço no meio da rua e em seguida tropeçar, buscando acompanhar certos desconhecidos que cruzam por nós e parecem nos fisgar alguma coisa valiosa.

Quanto à atual copa, acredito que não a perderei tão em breve. Afora as emoções espetacularizadas de eventos desse porte, eu enxergava ali, irradiadas por aqueles homens, alegrias e dores autênticas. Quando choraram esta derrota, não posso dizer que senti o sofrimento deles, mas certamente não me pareceram figuras banais.

Caso venham a perguntar-me, tempos mais tarde, sobre a copa de 2010, falarei em detalhes das pernas de Michel e do prazeroso ângulo da câmera ao lhe mostrar, de costas, cobrando as laterais, assim como darei especial ênfase ao semblante quase ríspido, quase touro, e depois hipnótico, o semblante de Daniel, ao levantar a camisa, de repente mais pele, caminhos fluviais e tatuagem, para limpar o nariz minutos antes de o jogo terminar - inesperadamente a cena mais bonita da minha copa.


enquantocorposonoro.blogspot.com

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